Um grupo de promotores de Justiça,
procuradores da República e procuradores do Trabalho, integrantes do Ministério
Público de diversas partes do Brasil assinou, nesta sexta-feira (11), um texto de repúdio ao que considera
“banalização da prisão preventiva” do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT).
Na quinta-feira (10), Lula foi alvo de um pedido de prisão preventiva
feito pelo Ministério Público Estadual de São Paulo. A decisão do MPE paulista
despertou críticas entre magistrados e até mesmo entre políticos de oposição,
que consideram o pedido “sem consistência e fundamentação”.
Confira a Nota de Repúdio:
"O grupo vêm a público externar sua
profunda preocupação com a dimensão de acontecimentos recentes na quadra
política brasileira, e que, na impressão dos/as subscritores/as, merecem uma
reflexão crítica, para que não retrocedamos em conquistas obtidas após anos de
ditadura, com perseguições políticas, sequestros, desaparecimentos, torturas e
mortes”, diz o texto, que também enumera:
1. É ponto incontroverso que a
corrupção é deletéria para o processo de desenvolvimento político, social,
econômico e jurídico de nosso país, e todos os participantes de cadeias
criminosas engendradas para a apropriação e dilapidação do patrimônio público,
aí incluídos agentes públicos e privados, devem ser criteriosamente
investigados, legalmente processados e, comprovada a culpa, responsabilizados.
2. Mostra-se fundamental que as
instituições que compõem o sistema de justiça não compactuem com práticas
abusivas travestidas de legalidade, próprias de regimes autoritários,
especialmente em um momento em que a institucionalidade democrática parece ter
suas bases abaladas por uma polarização política agressiva, alimentada por
parte das forças insatisfeitas com a condução do país nos últimos tempos, as quais,
presentes tanto no âmbito político quanto em órgãos estatais e na mídia, optam
por posturas sem legitimidade na soberania popular para fazer prevalecer sua
vontade.
3. A banalização da prisão preventiva
-aplicada, no mais das vezes, sem qualquer natureza cautelar – e de outras
medidas de restrição da liberdade vai de encontro a princípios caros ao Estado
Democrático de Direito. Em primeiro lugar, porque o indivíduo a quem se imputa
crime somente pode ser preso para cumprir pena após o trânsito em julgado da
sentença penal condenatória (CF, art. 5º, LVII). Em segundo lugar, porque a
prisão preventiva somente pode ser decretada nas hipóteses previstas no art.
312 do Código de Processo Penal, sob pena de violação ao devido processo legal
(CF, art. 5º, LIV).
4. Operações midiáticas e
espetaculares, muitas vezes baseadas no vazamento seletivo de dados sigilosos
de investigações em andamento, podem revelar a relação obscura entre
autoridades estatais e imprensa. Afora isso, a cobertura televisiva do cumprimento
de mandados de prisão, de busca e apreensão e de condução coercitiva – também
utilizada indiscriminada e abusivamente, ao arrepio do art. 260 do Código de
Processo Penal – redunda em pré-julgamento de investigados, além de violar seus
direitos à intimidade, à privacidade e à imagem, também de matriz
constitucional (CF, art. 5º, X). Não se trata de proteger possíveis criminosos
da ação estatal, mas de respeitar as liberdades que foram duramente
conquistadas para a consolidação de um Estado Democrático de Direito.
5. A história já demonstrou que o
recrudescimento do direito penal e a relativização de garantias não previnem o
cometimento de crimes. Basta notar que já somos o quarto país que mais
encarcera no mundo, com mais de 600 mil presos, com índices de criminalidade
que teimam em subir, ano após ano. É certo também que a esmagadora maioria dos
atingidos pelo sistema penal ainda é proveniente das classes mais
desfavorecidas da sociedade, as quais sofrerão, ainda mais, os efeitos
perversos do desrespeito ao sistema de garantias fundamentais.
6. Neste contexto de risco à
democracia, deve-se ser intransigente com a preservação das conquistas
alcançadas, a fim de buscarmos a construção de uma sociedade livre, justa e
solidária. Em suma, como instituição incumbida da defesa da ordem jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, o
Ministério Público brasileiro não há de compactuar com medidas contrárias a
esses valores, independentemente de quem sejam seus destinatários, públicos ou
anônimos, integrantes de quaisquer organizações, segmentos econômicos e
partidos políticos.
Assinam o documento:
Afrânio Silva Jardim – MPRJ (Procurador
de Justiça aposentado)
Bettina Estanislau Guedes – MPPE
Daniela Maria Ferreira Brasileiro –
MPPE
Daniel Serra Azul Guimarães – MPSP
Domingos Sávio Dresh da Silveira – MPF
Eduardo Maciel Crespilho – MPSP
Fabiano Holz Beserra – MPT
Fernanda Peixoto Cassiano – MPSP
Helio José de Carvalho Xavier – MPPE
Juliana de Souza Andrade – MPSP
Júlia Silva Jardim – MPRJ
Júlio José Araújo Junior – MPF
Marcelo Pedroso Goulart – MPSP
Márcio Soares Berclaz – MPPR
Gustavo Roberto Costa – MPSP
Jacqueline Guilherme Aymar – MPPE
José Godoy Bezerra de Souza – MPF
Maísa Melo – MPPE
Maria Ivana Botelho Vieira da Silva –
MPPE
Maria Izabel do Amaral Sampaio Castro –
MPSP
Osório Silva Barbosa Sobrinho – MPF
Plínio Antonio Britto Gentil – MPSP
Raphael Luis Pereira Bevilaqua – MPF
Renan Bernardi Kalil – MPT
Rômulo de Andrade Moreira – MPBA
Thiago Alves de Oliveira – MPSP
Tiago Rodrigues Cardin – MPSP
Tiago Joffily – MPRJ
Tadeu Salgado Ivahy Badaró – MPSP
Taís Vasconcelos Sepulveda – MPSP
Westei Conde Y Martin Junior – MPPE
Com informações do Jornal O Dia
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